A Morte e as Águas

“Tudo o que vive surge das águas, como o sol, e para lá retorna ao anoitecer. Nascido das fontes dos rios e dos mares, o homem, após a morte, alcança as margens do Estige para realizar a travessia noturna. Seu desejo é que as águas escuras da morte se tornem águas de vida, que a morte e suas garras frias sejam útero, assim como o mar, quando engole o sol, confortando-o em sua profundeza.”

JUNG, Carl Gustav Jung, Wandlungen und Symbole der Libido, 1912. Trad. it. La libido: simboli e trasformazioni, Torino: Boringhieri, 1965, in: MORIN, Edgar. L’UOMO E LA MORTE. Trad. de Riccardo Mazzeo .Trento: Edizioni Centro Studi,  2014, p. 128.


Faz de conta

Será que só depois que a asa negra da morte passa é que o arco-íris aparece? Mesmo torto, mesmo com as cores desordenadas e confusas. Mesmo assim, não faz mal. Porque é só faz de conta. 
 

Swedenborg por Morel

“Para mim, é suficiente, senhores, deixar-vos entrever minha profunda convicção sobre o perigo do iluminismo e do amor ao maravilhoso inerente à nossa natureza, e sobre as consequências não menos perigosas dessa tendência, por assim dizer, instintiva, do espírito humano, que chega a dar, aos fatos mais justificáveis pela explicação científica das coisas da vida, um cunho sobrenatural.

Eu vos falei inicialmente da América, que parece ser hoje o país preferido de todas as extravagâncias do espírito humano. É lá que parece se concentrar, como núcleo de predileção, o amor ao sobrenaturalismo. Disso sabemos alguma coisa pela epidemia que, a partir desse país, se difundiu para o mundo inteiro e que, entre muitos indivíduos, suscitou, na esfera do sistema nervoso, manifestações próprias a aterrorizar nossos novos Prometeu. Ainda uma vez, a razão humana nada tem a ganhar com esse modo de interpretar os fatos e de buscar a origem deles. A verdade não nos entrega seus segredos nem pela violência nem pela impostura. Se o mundo e as maravilhas que ele encerra são entregues às nossas investigações, nós não chegaremos a compreender tantos fenômenos, a interpretar as leis que o próprio Deus lhes impõe, senão que sob a condição de proceder com calma, maturidade e reflexão. Os progressos do espírito humano dependem da observação metódica dos fatos de ordem científica. Qualquer outro proceder nos expõe corpo e alma à influências da impostura, e , em lugar da verdade que eleva o espírito, que o fecunda e vivifica, não nos entrega senão fantasmas que fazem retroagir a razão e alucinam as inteligências.”

MOREL, Bénédict Augustin. SWEDENBORG : SA VIE, SES ÉCRITS, LEUR INFLUENCE SUR SON SIÈCLE, ou COUP D OEIL SUR LE DÉLIRE RELIGIEUX. Paris : Imprimerie de Alfred Péron, 1859.

Clarice, naturalmente

"Porque enquanto eu amar a um Deus só porque não me quero, serei um dado marcado, e o jogo de minha vida maior não se fará. Enquanto eu inventar Deus, Ele não existe."

Clarice Lispector, no livro “Felicidade clandestina”. Rio de Janeiro: Rocco, 1998. Fonte: Revista Prosa e Verso e Arte 

Pensamentos de domingo

Pensando em novembro que entra com mortos, com novos mortos, aliás, certamente precisando se adaptar àquilo que alguns insistem em chamar de outra vida. 

Cemitérios

Cemitérios têm uma beleza implícita, inerente a seu contexto. Eles refletem as cidades nas quais se encontram, senão uma parte delas, quando há mais de um. Elaboram-se segundo uma tradição de ordem geral, cuja regra maior é a chamada arte funerária, e também segundo uma concepção local, que corresponde, mais ou menos, a um modelo de moradia elaborada para os que partiram. Passeando por uma cemitério, vemos como foram arrumadas as lápides dos mortos, tarefa da qual se incumbem, de regra, os parentes. Enfeites, flores, coloridos inesperados, por vezes surpresas, como esta da foto, onde a cruz foi enfeitada por obra de insetos que ali construíram sua morada. As palavras se repetem, e reiteram saudades...