A Verdade


"O místico é literalmente aquele que se cala, que sabe alguma coisa que os outros não sabem. Nós acreditaríamos nele, de resto, mesmo que ele nada tivesse de orfismo ou de eleusianismo: nem toda verdade é boa de se dizer; não se responde a todas as perguntas. Ao menos, não se diz não importa o quê a não importa quem. Há verdades que é preciso manejar com precauções infinitas, através de toda espécie de eufemismos, de astúcias e perífrases. O espírito não se coloca sobre elas, senão que as descrevendo em grandes círculos, como um pássaro. Mas isso é ainda dizer pouco: há um tempo para cada verdade, uma lei de oportunidade que está no princípio da iniciação. Antes é muito cedo; depois é tarde demais. É a verdade que se insere nesta história? Ou a consciência que se desenvolve segundo a duração? Pouco importa nesse instante: o certo é que há toda uma deontologia do verdadeiro que repousa sobre o sentido irracional da ocasião, ou, como nós diríamos de boa vontade, da conjuntura. Não é tudo dizer a verdade, 'toda a verdade', não importa quando, como um bruto: a verdade quer ser graduada; administra-se-a como um elixir poderoso e que pode ser mortal, aumentando a dose a cada dia, para deixar ao espírito tempo de habituar-se."
JANKÉLÉVITCH, V, L'ironie. Paris: Alcan, 1936, p. 40-41, tradução minha.

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