A alquimia, não obstante a seriedade com que é até hoje encarada por muita gente, mostrou-se no passado um terreno fértil bastante apropriado ao manejo de hábeis mistificações. Houve fabricantes de ouro aos quais reis e príncipes queriam se ligar, fazedores de moeda falsa, iluminados escroques que funcionaram por séculos. Surgindo bruscamente num país, desapareciam para surgir alhures, abusando dos crédulos da maneira mais vergonhosa. Nunca lhes faltou uma corte de ingênuos encantados com sua suposta sabedoria. No século XVII, um certo Georges Sabellicus foi célebre em muitos países pela autoridade que adquiriu, fazendo-se passar por chefe supremo dos astrólogos e alquimistas. Milhares de mulheres idosas viam esse alemão como se fosse um deus. Deixando-as nuas, ele vendia-lhes talismãs reputados infalíveis para a fabricação de ouro. Infalível parece ter sido sua habilidade e, certamente, a ela se deve sua merecida fama.
O famoso César, curioso charlatão que viveu em Paris ao tempo de Henrique IV, comerciava toda sorte de talentos, indo dos talismãs à evocação do diabo, sem falar na prática da prestidigitação e transmutação dos metais, é claro. Era muito inteligente, e vangloriava-se de poder fazer aparecerem demônios cornudos e, como convém, munidos de cascos e da inevitável cauda. Aqueles que haviam assistido à exibição de Belzebu encontraram-se todos, após a sessão, profundamente abatidos, segundo ele. O bom-humor de César, todavia, não impediu que ele caísse nas mãos de agentes do rei que se encarregaram de alojá-lo gratuitamente na prisão. Seu brusco desaparecimento fez correr o boato, em 1611, de que César fora carregado pelo diabo.
Henrique I deixou-se seduzir por um pretenso rosa-cruz errante que encontrou em Sedan. Vangloriava-se de possuir o segredo da Grande Obra. Seu método era muito simples: um miraculoso pó vermelho de seu preparo devia ser acrescentado a óxido de chumbo cristalizado, e o rei acabou comprando o produto. A mesma peça foi amplamente empregada por outros charlatões, nem todos com muita sorte. Foi o caso de um que acabou queimando como uma tocha, juntamente com toda a parafernália que usara para enganar, durante dois anos, uma princesa inglesa.
O iluste Saint-Germain, sobre o qual há controvérsias até hoje, não pode deixar de integrar nossa plêiade de alquimistas, logo ele, que soube tão bem desfrutar de fama e prestígio à sombra do trono de ninguém menos que Luis XV, Rei de França, que o recebeu, note-se bem, graças à influência de Madame de Pompadour. Charme era o que parece não lhe haver faltado jamais. Estranho, enigmático, contraditório, de origem incerta, alegava ter 4.000 anos de idade. Afirmou haver estado presente às bodas de Canaã, e possuir, — como duvidar? — o elixir da longa vida, a água da juventude, o segredo de aumentar o volume das pérolas... E era singularmente acreditado! Também pudera! Além de um certo encanto, possuía inteligência e, ao contrário dos charlatões vulgares, Saint-Germain não era imprudente, não falava demais, como o faria um fanático nem seduzia como um falso cientista. Em todo caso, quando falava, podemos imaginá-lo afastando o tédio dos nobres salões que freqüentava, narrando suas vidas passadas, cuja lembrança permanecia viva em sua memória. Ao seu redor, formou-se um grande séqüito. Não lhe faltaram amigos nem dinheiro e, imponente, desfilou pela vida caminhando firme por sobre o tapete que a credulidade geral soube estender por debaixo de seus elegantes e bem calçados pés. Consta que morreu em 1784.
Também sutil e não menos inteligente, mais um aventureiro célebre que, entre outras coisas, fabricou ouro, foi o encantador Casanova. Conseguindo fazer-se passar por “adepto” ele vendeu para a crédula Marquesa d’Urfé temíveis segredos. No Castelo de Pontcarré, o hábil veneziano persuadiu a velha louca de que ele obtinha à vontade o ouro filosófico, graças ao auxílio de uma árvore ou fuso de projeção. A própria Marquesa tentaria, através de uma operação de gênero especial e peculiar, a procriação de um ser sobrenatural, cujo nome era Horosmasdis e no qual a alma de Madame d’Urfé encontraria um invólucro especial.
Mas creio que esses exemplos já são o bastante. Muito embora essas excentricidades possam ser jocosas e mesmo hilariantes, o fato é que a procura da pedra filosofal, oferecendo a possibilidade de transmutar os metais mais ordinários em ouro, apaixonou numerosos senhores, reis e rainhas: uns sonhando com o fausto e a glória que acompanha a fortuna; outros, com um modo rápido de cobrir déficits públicos, ou mesmo um patrimônio pessoal julgado insuficiente. Os verdadeiros alquimistas, porém, probos e sábios, jamais aceitariam trabalhar atrelados a coroas. Eram sinceros, sensíveis e não desejavam enganar ninguém. Não se os pode conceber capazes de prostituir a ciência que consideravam sagrada, tornando-a um “meio” e não um “fim”.