O que são arcanos, afinal?

O que comumente se entende pela palavra arcano é um segredo de ordem mágica, algo oculto ou, no mínimo, algo não-explícito ou antes implícito, inerente a dado sistema. Os ditos arcanos corresponderiam à tradução aproximada [ou implícita] de um mecanismo tido como secreto, inerente à natureza, permitindo, todavia, entrever-se o seu funcionamento. Assim, por exemplo, no Tarô, os arcanos estariam representados por desenhos que teoricamente estimulariam a imaginação de leitor, sugerindo-lhe a realização de um trabalho de meditação e aprofundamento. Na Cabala, estariam representados nas propriedades do alfabeto hebreu, espécies de energias circulantes na chamada Árvore da Vida. Os alquimistas, por sua vez, têm para eles que os arcanos estariam expressos em diferentes níveis da realidade, nas mais variadas combinações das substâncias químicas, aí incluídos nossos humores bem como nossos desejos.

O Arcano XV

Não nos esqueçamos de que é o DIABO que nos faz viver materialmente. Ele nos arma para as necessidades desta vida de luta perpétua, de onde os impulsos que não são maus em si mesmos, mas entre os quais a harmonia deve ser mantida, se não quisermos cair sob o jugo dos pecados capitais que se dividem entre aquilo que poderíamos chamar de os departamentos ministeriais do governo infernal. Moderemo-nos em todas as coisas, e nós nos oporemos às discordâncias que, sozinhas, tornam-se diabólicas. Contenhamos nosso ORGULHO, a fim de que ele se traduza em DIGNIDADE, essa nobre altivez que inspira o horror a toda degradação. Domemos nossa CÓLERA, a fim de que ela se traduza em CORAGEM e em energia ativa. Não nos abandonemos à PREGUIÇA, mas concedamo-nos o REPOUSO necessário à reparação das forças despendidas. Não temamos mesmo repousar preventivamente à vista de um esforço a produzir. Os artistas e os poetas podem ser preguiçosos de maneira frutífera. Evitemos a GULA: é degradante não viver senão que para comer; mas, para viver com boa saúde, escolhamos nossos alimentos e apreciemos suas qualidades gustativas. Repilamos o odioso demônio da INVEJA que nos faz sofrer com o bem de outrem, mas oponhamo-nos, no interesse geral, às monopolizações ilícitas e aos abusos do poder. Não caiamos na AVAREZA, mas sejamos PREVIDENTES e pratiquemos a economia sem desdenhar o honesto amor ao ganho, estimulante eficaz do trabalho. Quanto à LUXÚRIA, pela qual se exerce a mais poderosa dominação do DIABO, é preciso opor-lhe o RESPEITO religioso ao augusto mistério da aproximação dos sexos. Cessemos de profanar aquilo que é sagrado.
Oswald Wirth

Morte

A Morte é uma vivência constante. Cada desilusão nos mata um pouco e deixa no lugar uma escuridão a mais que luz alguma pode iluminar. Acho que é por isso mesmo que se vive tão urgentemente às vezes, antecipando as perdas, e fazendo qualquer coisa para manter a ilusão, ainda que seja às custas de um ostensivo, dispendioso e belo monumento de bronze, homenagem última a quem partiu, cedo ou tarde, deixando um nome, uma saudade, um querer. Morrer, porém, não é privilégio dos mortos, porque morremos em vida também, quando somos esquecidos ou mudados, quando somos desencontrados enfim. Morremos ainda quando nos deixamos lá atrás, no passado. Vieira falava disso em termos literários, ele que afirmou que vivia com privilégios de morto, não tendo ninguém a quem sua presença fizesse falta ou sua ausência, saudade.
Vida e Morte são irmãs, ambas inspiradoras do homem que, através de seu sentir, as simboliza e materializa em formas artísticas, como que encantando o espaço disputado ao tempo, tanto quanto cada segundo de vida que disputa à morte ao lhe conferir um sentido.
Vida só é vida se faz sentido.
Vida que não faz sentido, não é vida, mas morte.