A teoria conspiracionista é, pois, antes de tudo, uma teoria antagonista, verdadeiramente negadora do acaso e do aleatório. Uma expressão típica desse gênero de literatura é precisamente a fórmula: “Não é por acaso que...” Não apenas qualquer acontecimento simultâneo pode ser assim reinterpretado em termos de causalidade, mas haverá também recurso a formas patológicas, delirantes do pensamento analógico. É assim que o abade Barruel explica a forma triangular da lâmina da guilhotina, não pela maior eficácia do corte enviesado, mas pela vontade dos revolucionários de dar ao “corte republicano” a forma do triângulo maçônico. Não é por acaso, afirma, no mesmo espírito, o dirigente negro antissemita Louis Farrakhan, que os dólares trazem em seu reverso uma águia que paira sobre treze estrelas (correspondendo aos treze Estados aliados na guerra da independência americana), porque, ligando as estrelas umas às outras, obtém-se... a estrela de David! Raoul Girardet, por sua vez, mostra que, no século XIX, “certa imprensa antissemita denunciará o incremento metropolitano parisiense como uma empresa do complô judaico visando a fazer pairar sobre a capital inteira uma permanente ameaça de destruição ”. Ora, a mesma ideia reaparece em data recente entre alguns grupos extremistas russos a propósito do metrô de Moscou, cujo traçado era reputado como reproduzindo sinais cabalísticos. Constata-se, pois, uma ressurgência das temáticas. A negação do acaso permite assim acumular “provas” que não o são, por meio de fatos anódinos reinterpretados como “marcas diabólicas”, ou seja, “assinaturas”, atestando para o olho exercitado a realidade do complô. “Nesse sentido, acrescenta Xavier Rihot, e é outro paradoxo, os conspiracionistas, malgrado seu tradicionalismo declarado, dão prova de uma mentalidade tipicamente moderna: ao invocarem grandes ideologias, eles pensam que a realidade histórica é integralmente decifrável e excluem aquilo de que a razão não quer ouvir falar: o aleatório, o acidente, a exceção, o acaso.
A rejeição do aleatório leva a uma extraordinária descontextualizarão. Se o acontecimento não pode se revestir do imprevisto, mas atesta, ao contrário, a realidade de um plano que se pode interpretar como uma espécie de contraordem natural, é porque o curso das coisas obedece a uma lógica que lhe é exterior. A conspiração engendra os acontecimentos, mas não é afetada por nenhum deles. Ela explica a história, mas ela própria se mantém fora da história. O complô se define, pois, não apenas por sua ubiquidade, mas por sua transistoricidade. Enfim, ele existe em todos os tempos como em todos os lugares: a história manipulada pelos conspiradores não é senão que a realização de um projeto elaborado fora dela. Note-se, a propósito, que a maçonaria, atribuindo a ela própria origens fabulosas que remontam à construção do Templo de Salomão, quando não a Adão e Eva, pôde, indiretamente, favorecer a ideia que o complot do qual ela seria o motor atravessou os séculos: na Alemanha, desde 1778, o dominicano Ludwig Greinemann, de Aix-la-Chapelle, não hesita em afirmar que os judeus responsáveis pela morte de cristo eram franco-maçons, que Heródoto e Pôncio Pilatos frequentavam lojas maçônicas, e que Judas, antes de denunciar Jesus, filiara-se, ele próprio, a uma loja!
BENOIST, Alain. Psychologie du
conspirationnisme. Disponível em: https://s3-eu-west-1.amazonaws.com/alaindebenoist/pdf/psychologie_du_conspirationnisme.pdf
Tradução MBT
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