A Via Expiatória

Em educação, o negativo precede o positivo; nós aprendemos a nos abster do mal antes de nos exercitarmos na prática do bem. O que se aplica à moral conserva seu valor no domínio do intelecto; é assim que o discernimento do erro antecipa normalmente a percepção do verdadeiro. O que é falso nos ofusca e nos repele com mais força do que a verdade pode desdobrar para nos atrair. Por sua natureza, ela é discreta, sempre velada, jamais barulhenta ou ostensiva; ele não disputa com o erro a opinião das massas, mas deixa virem a ela os amantes fervorosos que são os sábios.
Aqueles que não querem amar senão a verdade não devem se deixar seduzir pelas cortesãs espalhafatosas e maquiladas: elas figuram o erro atraindo quem percorre as ruas; elas bajulam o transeunte que desviam de seu caminho, se ele não sabe resistir aos seus encantos. Elas são inumeráveis, essas moças enfeitadas que disputam entre si a opinião dos mortais; cada uma tem múltiplos amantes que imaginam possuir a verdade. O iniciado vê nelas as sacerdotisas da ilusão; ele as evita, para não sofrer outra atração senão aquela da longínqua Dama de seus pensamentos.
Única digna de seu amor, a Verdade pura atrai sua alma sem reservas. Não podendo amar senão o verdadeiro, ele torna-se refratário ao falso, ao qual não dá nenhuma derivação. Tal é o estado psíquico e mental a que devem conduzir as provas iniciáticas. Se, no Tarô, o Iniciável é figurado pelo Saltimbanco (Arcano I) convém reconhecer nos Amantes (Arcano VI) o neófito resistindo às aparências sedutoras, a exemplo do jovem Hércules, que prefere a austera Virtude às volúpias do Vício.
O que distingue, aliás, o Iniciado do Profano é que este se liga aos enganos exteriores, enquanto o sábio se recusa a ser enganado. Isso não significa, de modo algum, que o mistério das coisas seja revelado ao pensador desiludido: ele é tão ignorante quanto o vulgo, mas sabe que nada sabe. Assim agindo, livra-se de todo fardo dos erros que encobrem aquele que acredita saber. Nada de falso admitir é, para a inteligência, uma riqueza negativa, infinitamente preciosa ao iniciante que, liberado de todo passivo, pode trabalhar daí para frente com segurança na aquisição de um saber positivo.
Oswald Wirth
Extraído de Os Mistérios da Arte Real