O Livro dos Demônios


"Você consegue imaginar o que seja o Caos, essa dimensão inconcebível? Claro que não. Você não passa de um mortal: a Luz te ofusca e as Trevas te confundem." (p. 291)

Aí vai uma das minhas passagens favoritas, trecho de uma das falas de Mefistófeles em conversa com o autor. O livro é primoroso na edição, digna das potências infernais, seja pela qualidade gráfica da obra, seja pelo seu instigante conteúdo. A escrita é densa, bastante descritiva.  Os personagens?  Demônios. Entrevistados, cada um em seu próprio cenário. Antônio Augusto trabalhou a escrita com rara habilidade, pois fez com palavras o que só Goya e Boch fizeram com seus pincéis.

Uma obra propositadamente sem índice, avisa-nos o autor, para que o leitor se sinta também desamparado, assim como ele, que viajou até o inferno para entrevistar figuras de quem todos já ouvimos falar.

O Livro dos Demônios, por Antônio Augusto Fagundes Filho. 

Então...

 

Era uma vez alguém que gostava de imaginar coisas e depois desenhar e guardar, para que algum dia alguém olhasse e pudesse descobrir o produto de sua imaginação. 

Coisas feitas. 

Bem assim.

Misticismo


 Porque, na variedade do universo simbólico, as cores são tão necessárias quanto o sincretismo dos temas. 

Ave Maria


Ave Maria, gratia plena, Dominus tecum.

Benedícta tu in mulieribus,
et benedictus fructus ventris tui, Iesus.

Sancta Maria, Mater Dei,
ora pro nobis peccatoribus,
nunc, et in hora mortis nostræ.
Amen.

Em nome de deus

 Na introdução à peça IN NOMINE DEI, escreveu Saramago:

‘Entre o homem, com a sua razão, e os animais, com o seu instinto, quem, afinal, estará mais bem dotado para o governo da vida? Se os cães tivessem inventado um deus, brigariam por diferenças de opinião quanto ao nome a dar-lhe, Perdigueiro fosse, ou Lobo-d’Alsácia? E, no caso de estarem de acordo quanto ao apelativo, andariam, gerações após gerações, a morder-se mutuamente por causa da forma das orelhas ou do tufado da cauda do seu canino deus? Que não sejam estas palavras tomadas como uma nova falta de respeito às coisas da religião, a juntar à Segunda Vida de Francisco de Assis e ao Evangelho segundo Jesus Cristo. Não é culpa minha nem do meu discreto ateísmo se em Münster, no século XVI, como em tantos outros tempos e lugares, católicos e protestantes andaram a trucidar -se uns aos outros em nome do mesmo Deus — In Nomine Dei — para virem a alcançar, na eternidade, o mesmo Paraíso. Os acontecimentos descritos nesta peça representam, tão-só, um trágico capítulo da longa e, pelos vistos, irremediável história da intolerância humana. Que o leiam assim, e assim o entendam, crentes e não crentes, e farão, talvez, um favor a si próprios. Os animais, claro está, não precisam.”

SARAMAGO, José. In Nomine Dei. Lisboa: Editorial Caminho, 1993, p. 9-10.

Pensando bem....

 A paz é mágica.  É a placenta nutriz e deliciosamente terapêutica na solidão daquele que concebe, gera e cria.


Manual da liga anti-maçônica

 

Quem se interessa por Maçonaria vai gostar de ler esse pequeno manual que documenta, historicamente inclusive, a visão que a Igreja tinha a respeito dos maçons e da Maçonaria. Trata-se da edição portuguesa, publicada em Coimbra, 1886.

Segue uma amostra, observada a grafia da época:

Todos os mações conhecem e querem o fim anti-religioso e anti-social da seita? Não, ha muitos a quem são escondidos estes designios perversos e que todavia cooperam INCONSCIENTEMENTE com a sua influência e o seu dinheiro para o fim anti-religioso e anti-social da seita.

Como se exprimem a respeito d'estes mações honestos e ignorantes os verdadeiros iniciados e chefes da seita? Rindo-se da sua ignorância tratam-n'os de simplorios e imbecis. "Se não têm esperteza, têm dinheiro. É boa gente e precisamos cá muito d'ella. Serve para encher a caixa. Tratae pois de alliciar; é preciso que mordam no anzol, mas acautelemo-nos de lhes communicar nossos segredos." (Palavras de Weishaupt, o grande organisador da Maçonaria.

Disponível em: https://pt.scribd.com/document/516335151/Manual-da-liga-anti-maconica


Os Livros Malditos


 Nesses tempos absolutamente paranoides e conspiracionistas, nada como por mais lenha na fogueira e mergulhar na releitura de Jacques Bergier, sempre um clássico, mestre absoluto na abordagem de temas polêmicos. Destaque aqui para a história do manuscrito Mathers, encontrado por acaso em um sebo londrino. Depois de decifrado, terminou por estabelecer o primeiro passo do que viria a ser, mais tarde, a famosa Golden Dawn.

BERGIER, Jacques. Les libres Maudits. Paris: J'ai lu, 1971.

Joseph Ratzinger


 "Em seus escritos sobre a massa, a mesma massa que o esperava do lado de fora, para cumprimentar o novo papa. ele quis banir as canções durante a missa e, com isso, deixou claro para o conjunto de fiéis que ele considerava seu comportamento indigno de uma missa sagrada. [...] Como seria possível mandar aquele homem, que disse claramente que não queria nada com as celebrações barulhentas das missas, postar-se diante das multidões?"

ENGLISCH, Andreas. O homem que não queria ser papa. São Paulo: Universo dos Livros, 2013, p.10

Em tempo: o livro é muito bom. Ao menos para quem, como eu, acredita que ele continua sendo o papa. Aos interessados, sugiro que pesquisem acerca do documento de renúncia assinado por ele em 10 de fevereiro de 2013 que, recentemente, foi alvo de questionamentos bastante consistentes. 

Tua partida

A maltratada planta padece em um balde plástico. Improviso meu. Não tenho esse espírito verde. Não é incomum que me esqueça das poucas plantas que tenho, quanto mais a romãzeira, ex-bonsai, desengonçada muda que troquei do vaso original para um balde, ex-lixeira, hoje quase esquecida na sacada. Entre o morre-não-morre, contudo, parece que preferiu o bem-me-quer, porque floriu, ou vai florir. São já tantos botões. Seriam mais, se eu contasse o primeiro que, há alguns dias, destruí sem querer, de tanto espanto. Logo a romãzeira. Logo ela, meio morrida, meio matada, agora me floresce, ainda floresce, mesmo depois de meu gesto desastrado e brutal. Impossível não pensar, por isso mesmo, no outro gesto, desastrado e brutal também, que te levou embora, definitivamente. De mim, já havias partido, e nunca soube direito o que fazer do teu lugar, porque volta e meia estavas ali, bem ali e bem aqui, entre livros e músicas, os melhores que já conheci, assim como contigo foram os dias, — agora eu sei —, os melhores que já vivi, porque foram todos os dias da minha juventude. Tanto tempo longe, na distância do estranhamento dos que a vida separou. Saber então da tua morte, saber que ela não foi em paz. Tragédia ou destino, quem sabe, porque a paz dos rebanhos não seria nunca uma ambição tua. Tristeza. Mas tristezas são já quase banais para mim, agora que fiquei por último, despossuída de quatro décadas de vida, memórias escritas nas areias do mar. Tornada alma desgarrada, olho em volta. Busco sinais. Afinal, sempre havia planos, chamados, esperas. Agora não há mais. Exceto a romãzeira, a prometer florações e, quem sabe, até improváveis frutos. Exceto esta minha frágil romãzeira, que agora me parece tão misteriosa e mágica quanto a Esperança, remédio dos desenganados, eu sei. Logo ela, de longe aparentada com a Acácia, esta que tu conhecias tão bem. 

 

Efeméride

Hoje é aniversário da morte de Oswald Wirth, que aconteceu em 9 de março de 1943, às 11 horas. Foi coincidência lembrar disso, ao rever uma postagem que fiz aqui em 2009. Sinto falta do tempo em que Wirth era, para mim, uma leitura constante. Sinto muita falta. Estranhamente, ia dizer agora que era uma leitura esperançosa. Mas não se trata da esperança, absolutamente. Trata-se de sua perda. Ocorreu-me, contudo, o sentido da morte, e a metáfora dos tempos em que se vive sem mestres. A saber do cadáver. A saber da carne que se desprende dos ossos.