Em nossos dias a Arte Real continua a ser ensinada.
Verdade que o é sob o véu dos símbolos, cujo sentido nem sempre foi penetrado.
Os maçons do século XVII puderam assim se proclamar adeptos da Arte Real,
porque os reis outrora se interessaram pela obra das corporações construtivas,
privilegiados, na Idade Média, por erguerem, em toda cristandade, os edifícios
sagrados. Quando a Maçonaria Moderna se liberou de toda preocupação
arquitetural profissional, por preconizar somente uma construção filosófica
puramente moral e intelectual, Arte Real tornou-se sinônimo de Grande Arte ou
de Arte por excelência. Não é ela, afinal, a Arte Suprema segundo a qual a
humanidade em seu conjunto deve ser construída, arte que se aplica, além disso,
a cada indivíduo destinado a ocupar seu lugar no imenso edifício?
Mas é tempo de restituir à velha expressão tradicional seu sentido primitivo. Não é preciso que a Franco-Maçonaria oculte que ela tem por missão preparar seus adeptos para uma verdadeira realeza: aquela do Cidadão, soberano no Estado Moderno.
Antes de tudo, esse Soberano deve ter consciência de sua dignidade. Ele não reconhece, acima dele, nenhum poder diante do qual se humilhe para solicitar favores. A coisa pública (res publica: República) é coisa sua, sua propriedade, pela qual ele é responsável. Ele não sofre nenhum abuso e zela para jamais se tornar cúmplice de um ato que lese o interesse geral.
Assim compreendida, a Arte Real deve ser ensinada aos republicanos, porque enquanto não receberam uma educação de reis, não saberão exercer sua soberania. Esta permanecerá falaciosa, até o dia em que os cidadãos forem penetrados pelo dever de realeza coletiva que é seu apanágio. Se, por sua moralidade, eles não se elevarem acima da condição de escravos, nenhuma das proclamações oficiais mudarão a sua sorte. Sob a etiqueta mais democrática, eles continuarão a sofrer o jugo que não terão energia de vencer. A queda de um trono não confere, de uma vez por todas, a liberdade. Esta última pede para ser constantemente conquistada por aqueles que quiserem merecê-la. Guardemo-nos, pois, de dormir sob o louro de nossos pais, que derrubaram a Bastilha: jamais seremos livres se não soubermos sacrificar continuamente nossas ambições mesquinhas ao bem geral. Sob qualquer regime que seja, sacerdotes e reis nos dominarão, enquanto não houvermos aprendido a suplantar em nós mesmos sacerdotes e reis.
Mas como subtrair-se dessa dominação senão que nos inspirando no adágio: não se suprime aquilo que se substitui. Não é em vão que o Iniciado é chamado a se tornar seu próprio rei e seu próprio sacerdote.
Ele será rei quando reinar sobre si mesmo, quando aquilo que ele tem de mais elevado se fizer obedecer pelo que nele é inferior. Esse Mestrado de si pode conferir apenas a dignidade real, característica do cidadão zeloso de sua soberania nacional.
Ninguém deve poder, de outra parte, abusar da imaginação do soberano. Este se iniciará, pois, nos mistérios da Arte Sacerdotal, para não ser enganado nem pelo representante de Deus que promete a felicidade no outro mundo, nem pelo charlatão político, pretenso detentor da panaceia universal pondo fim a todas as misérias sociais.
O verdadeiro Mestrado se subtrai a todas as decepções; mas ele só é adquirido ao preço de esforços sustentados, dirigidos contra todas as nossas fraquezas intelectuais e morais.
Fonte: WIRTH, Oswald. LaFranc-Maçonnerie rendue
intelligible àses adeptes. Le Maître. Paris: Dervy, 2003.
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