A Missão dos Iniciados


 Em todos os tempos e sob todas as latitudes, encontram-se espíritos leais aspirando à verdade, ao bem de seus semelhantes e à supressão dos males de que sofrem os homens por sua própria culpa. Esses sábios têm às vezes feito escola, instruindo discípulos. Dando exemplo de uma vida austera, nada temeram em certas circunstâncias, enfrentando publicamente os abusos do dia. Atraindo perseguições, os reformadores foram constrangidos à prudência; tornaram-se discretos e se envolveram em mistério, sem abdicarem de nenhum de seus desejos generosos. Assim vieram à luz muitas associações mais ou menos secretas e independentes umas das outras, porém animadas por um mesmo espírito de justiça e de filantropia.
Desse ponto de vista, a Franco-Maçonaria atual é incontestavelmente a herdeira das mais nobres tradições. Obreira do progresso humano, ela tem plena consciência de seu papel emancipador. Não se enfeudando a nenhuma escola e não tomando parte de nenhum sistema, ela procura, com plena independência, a luz que liberta de toda escravidão.
Sabendo que os povos não estão condenados a uma infância eterna, os Iniciados seguem uma evolução que eles aprimoram, trabalhando para elevar em toda parte o nível intelectual e moral.  Infelizmente, existem coalisões que conspiram em sentido contrário. Convencidos de que os povos têm interesse em serem mantidos sob tutela, esforçam-se por retardar a marcha normal das coisas e entravam o progresso.
Uma luta envolve assim, fatalmente, os construtores do amanhã e os conservadores timoratos de um passado do qual se beneficiam. Elementos diversos intervêm, de uma parte e de outra, nessa luta, cada um colocando em pauta os recursos de que dispõem.
O que distingue desse ponto de vista os Iniciados, é seu horror à violência. Jamais são eles os que tramam as revoluções sangrentas ou os que sublevam as multidões, excitando seus apetites. O método dos Iniciados resulta da experiência de séculos: ela é paciente, mas segura.
Sem dúvida, uma voz pode se fazer ouvir a propósito, para lembrar, ao sacerdote ignorante e à realeza degenerada, as modestas origens dos mais orgulhosos poderes. Quando o descendente de um chefe de bandidos primitivo se vangloria de ser ungido do Senhor, os filósofos podem permitir-se rir abertamente. Ele não proíbe tampouco as ironias, que exercitam sua verve às expensas de um pontífice infalível, cuja soberania espiritual remonta, através dos tempos, à muito equívoca autoridade de um pré-histórico chefe de feiticeiros.
Eis aí terríveis brincadeiras de crianças, porque, cuidadosos de nada revelarem muito bruscamente, os Iniciados em geral se contentam com sorrir entre eles das vaidades humanas. Temendo propagar intempestivamente verdades incendiárias, ele impõe uma discrição que é uma força terrível. Enquanto não for hora de falar, eles se calam, acumulando noções reconhecidas como verdadeiras, amadurecendo-as assim antes de lhes dar a conhecer.
Depois, eles têm a imensa vantagem de não serem utopistas. Eles sabem que a felicidade das coletividades só pode resultar da transformação dos indivíduos que as compõem. A saúde do corpo social depende do estado das células constituintes. Não emprestemos, portanto, uma importância exagerada à modificação dos regimes políticos ou sociais. São as pedras talhadas segundo o esquadro que asseguram a solidez da construção. A prática da arte de construir educou os Franco-Maçons que, renunciando à arquitetura material, não talharam menos seus materiais de construção. Desbastaram eles próprios a pedra bruta humana, que poliram com cuidado para adaptá-la às exigências do grande edifício. Trata-se aí dessa reforma intelectual e moral dos indivíduos que é o objetivo de toda verdadeira iniciação.
Sob símbolos diferentes, o programa permanece, com efeito, o mesmo, quando os Hermetistas ensinam alegoricamente como transmutar o chumbo em ouro, ou os Rosa-Cruzes dos séculos XVI e XVII assimilam ao Cristo, rei místico, o homem regenerado, morto para suas paixões, a fim de ressuscitar na pura luz.
Sem dúvida, esse Cristianismo iniciático não é aquele dos crentes vulgares; mas a Maçonaria, ela também, eleva-se ou abaixa-se na concepção de cada um, segundo o grau de iniciação conquistado efetivamente por seus adeptos; de onde a necessidade para estes de se instruírem tão completamente quanto possível, bem decididos a se desfazerem de seus preconceitos, a perderem suas ilusões, contribuindo para a emancipação particular e geral pela cultura simultânea, em si e em outrem, de todas as qualidades do espírito e do coração.
 
 Oswald Wirth

Fonte: WIRTH, Oswald. LaFranc-Maçonnerie rendue intelligible àses adeptes. Le Maître. Paris: Dervy, 2003. 

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